(matéria veiculada pelo Site Inovação Tecnológica em 21/11/2016)
O desenvolvimento de um microscópio multicor é um avanço esperado há décadas na microscopia eletrônica, a técnica usada para ampliar objetos milhões de vezes, permitindo construir imagens de coisas como membranas celulares a conexões sinápticas entre neurônios, revelando coisas que não podem ser vistas pela microscopia óptica.
“Nos últimos 50 anos, ficamos tão acostumados a micrografias eletrônicas monocromáticas que agora é difícil imaginar que poderíamos voltar a usá-las. Este método tem muitas aplicações potenciais em biologia. Em nosso artigo, nós demonstramos como ele pode distinguir compartimentos celulares ou rastrear proteínas e marcar células,” disse Stephen Adams, da Universidade da Califórnia em San Diego, principal responsável pelo desenvolvimento do novo microscópio.
“A capacidade de discernir múltiplas moléculas específicas simultaneamente acrescenta uma nova dimensão, revelando detalhes, ações e processos que não são necessariamente visíveis – nem mesmo suspeitados – em uma visão monocromática,” disse seu professor Mark Ellisman, cuja equipe trabalha nesse projeto há mais de 15 anos.
A micrografia eletrônica acima usa apenas duas cores para mostrar proteínas sendo absorvidas pela membrana celular. [Imagem: Adams et al./Cell Chemical Biology 2016]
Cores eletrônicas
A imagem gerada não é totalmente colorida como uma fotografia tradicional: a técnica trabalha com até três cores de cada vez (verde, vermelho e amarelo). As cores são geradas quando elétrons perdidos de íons metálicos pintados sobre a amostra sendo observada são capturados por um sensor no microscópio – a perda de energia do metal é registrada como uma cor.
Para isso foi necessário identificar complexos metálicos que fossem estáveis o suficiente para resistir à aplicação (o que significa que eles não podem deteriorar porque isso desfocaria a imagem) e tivessem uma assinatura distinta de perda de energia de elétrons (o que significa que cada emissão possa ser sempre interpretada como a mesma cor). Adams e seus colegas usaram lantânio ionizado (La), cério (Ce) e praseodímio (Pr).
O método ainda é bastante trabalhoso, já que cada complexo metálico deve ser depositado sequencialmente como um precipitado sobre a amostra já posta sob o microscópio. Um técnico precisa adicionar os metais ionizados um de cada vez e, em seguida, sobrepor o mapa de cada cor sobre a imagem monocromática original.
“Passamos muito tempo tentando descobrir como depositar um dos lantanídeos e depois limpá-lo para que ele não reagisse quando depositamos um segundo sinal sobre o mesmo local,” explicou Ellisman.
A nova técnica dá um novo impulso à microscopia de fluorescência. [Imagem: Adams et al./Cell Chemical Biology 2016]
Microscopia de fluorescência
Mas o trabalho valeu a pena: a equipe revelou, por exemplo, a imagem de duas células cerebrais compartilhando uma única sinapse e peptídeos entrando através de uma membrana celular.
A nova técnica é similar à microscopia de fluorescência, que detecta a luz colorida emitida por proteínas especiais adicionadas à amostra biológica. A vantagem é que agora é possível tirar observar detalhes que só podem ser capturados com microscopia eletrônica.
Fato digno de nota: a descrição da microscopia eletrônica multicor é um dos últimos artigos aceitos para publicação do professor Roger Tsien, que ganhou o Prêmio Nobel de Química de 2008 pela descoberta e aplicação da proteína verde usada na microscopia por fluorescência – Tsien morreu em agosto de 2016.
Bibliografia:
Multicolor electron microscopy for simultaneous visualization of multiple molecular species Stephen R. Adams, Mason R. Mackey, Ranjan Ramachandra, Sakina F. Palida Lemieux, Paul Steinbach, Eric A. Bushong, Margaret T. Butko, Ben N.G. Giepmans, Mark H. Ellisman, Roger Y. Tsien
Cell Chemical Biology
Vol.: 23, Issue 11, p1417-1427
DOI: 10.1016/j.chembiol.2016.10.006