(Entrevista publicada em 06/11/2015)
A Dra. Adriana de Castro Correia da Silva, pesquisadora da AGRAER/CEPAER, de Campo Grande, MS, transmite nesta entrevista à equipe TodaFruta toda a sua grande experiência com a cultura da pitaya.
TodaFruta – Qual a origem do nome PITAYA?
A palavra pitaya é originada do idioma Taíno (língua falada na região das Antilhas, na época da conquista espanhola) e significa fruta escamosa. Na língua inglesa, a fruta é conhecida como “dragon fruit”, em uma alusão às escamas da fruta, que remetem à figura do dragão.
TodaFruta – Qual a importância do centro de origem para o melhoramento?
O centro de origem de uma espécie é onde encontramos a maior diversidade de material genético, que pode ser útil para o melhoramento da cultura, principalmente no que diz respeito à resistência a pragas e doenças, tolerância a estresses abióticos, etc. Assim, é onde podemos buscar material que apresente características desejáveis em algum aspecto de cultivo.
No Brasil, quem são os maiores produtores?
O cultivo no Brasil é recente – tem pouco mais de 15 anos, e se destacam, como maiores produtores, os estados de São Paulo, Minas Gerais, Ceará, Paraná e Goiás, sendo que o estado de São Paulo é responsável por 92% da quantidade comercializada na CEAGESP em 2013. Em São Paulo, a pitaya é produzida em 49 municípios, sendo as regiões de Amparo, Presidente Prudente e São José do Rio Preto as mais importantes. As cidades de Socorro, Narandiba, Cedral, Arthur Nogueira e Ourinhos, juntas, são responsáveis por mais de 50% da produção do estado.
TodaFruta – A luz em excesso é prejudicial ao desenvolvimento das plantas, como conduzi-las?
Apesar de ser uma cactácea, a pitaya não tolera alta intensidade luminosa. Quando cultivada sob luminosidade excessiva os ramos amarelam e o crescimento é prejudicado, podendo levar à morte da planta. O contrário também é prejudicial: em excesso de sombra, as plantas ficam estioladas e a produção de flores é muito reduzida. Assim, recomenda-se que as plantas sejam cultivadas de forma a imitar o habitat de origem, e isto pode ser obtido utilizando-se telas de sombreamento, entre 30 a 60% de sombra, dependendo do local de cultivo. O sombreamento também pode ser obtido utilizando-se como tutores algumas espécies arbóreas, que fornecerão o sombreamento necessário no período de maior intensidade luminosa. Porém deve-se atentar à necessidade de poda destes tutores, para que o sombreamento não seja excessivo.
TodaFruta – Trabalhos realizados mostram que a pitaya é auto-incompatível, qual a importância desse relato?
É extremamente importante, quando da instalação do pomar, que o produtor tenha informação quanto à auto-incompatibilidade do clone que está plantando, que pode ser total ou parcial. No caso da parcial, há frutificação, porém de frutos sem valor comercial (os frutos são muito pequenos e com grande quantidade de casca). Quando uma planta é auto-incompatível é necessário, para que ocorra frutificação, a presença de pólen externo, ou seja, de outra espécie ou clone. O ideal para se reduzir a baixa frutificação e a ocorrência de frutos pequenos, sem valor comercial, seria o plantio de diversos genótipos e a realização da polinização cruzada, manualmente.
TodaFruta – Quais são os agentes polinizadores?
Em muitos países onde a cultura da pitaya foi introduzida, é relatado que a polinização é pobre, devido à falta de polinizadores naturais, encontrados em seu ambiente nativo. A pitaya apresenta florescimento noturno, de modo que morcegos, mariposas e abelhas são polinizadores naturais das pitayas. No Brasil, apenas as abelhas atuam como polinizadores e, devido ao seu tamanho, são muito menos eficientes que os morcegos, além de atuarem num período menor de abertura das flores, uma vez que o fechamento destas ocorre logo pela manhã. Assim, a polinização manual torna-se uma prática necessária para a obtenção de frutos comerciais.
TodaFruta – Como fazer a polinização manual?
A polinização manual pode ser realizada facilmente removendo-se as anteras de uma flor e tocando com ela o estigma de outra flor, ou então coletando-se o pólen e utilizando-se um pincel para polinizar múltiplas flores. A polinização pode ser realizada no fim da tarde ou no início da manhã. Recomenda-se cobrir as flores que serão polinizadas (com saquinhos de TNT, papel ou plástico) para que em caso de chuva não ocorra lavagem do pólen.
Foto 1 – Realização da polinização manual na manhã posterior à abertura da flor. Os estames de diversas flores são coletados em um recipiente plástico e, com o auxílio de um pincel, o pólen é transferido para o estigma das flores, realizando-se a polinização.
TodaFruta – A produtividade brasileira é boa? Como melhorá-la?
A produtividade do estado de São Paulo, na região de Presidente Prudente, é de 15 t/ha. Esse número é baixo, uma vez que pode alcançar 30 t/ha. Para melhorá-la, o produtor deve lançar mão de técnicas como irrigação e adubação, além da polinização manual.
TodaFruta – A pitaya é uma fruta não climatérica, quais os cuidados na colheita?
Frutos não climatéricos são aqueles que, depois de colhidos, não continuam o seu amadurecimento. Desta forma, devem ser colhidos totalmente desenvolvidos, quando apresentam o máximo de acúmulo de açúcares, ou seja, seu sabor está totalmente acentuado. O ponto de colheita da pitaya é determinado pela coloração da casca, que é característica do cultivar.
TodaFruta – Um produtor interessado em plantar pitaya deve formar suas mudas ou comprá-las de um bom viveirista?
O ideal, na implantação de um pomar, é utilizar material de procedência conhecida, sadio e produtivo. Há pouca quantidade de material disponível em viveiro. Assim, o ideal para iniciar o plantio seria a compra de material vegetal de outro produtor, que apresente qualidade fitossanitária e, a partir desse material inicial, o produtor realizar a multiplicação de suas plantas.
TodaFruta – Quais os principais problemas fitossanitários, observados na condução dos seus experimentos?
A pitaya apresenta poucos problemas fitossanitários. Pragas também ocorrem esporadicamente, em determinadas fases de crescimento. Com relação às doenças, a principal observada foi a podridão bacteriana, principalmente em condições de alta umidade e temperatura. A pulverização preventiva com cúpricos pode ser uma forma de se evitar a ocorrência de problemas fitossanitários.
TodaFruta – Que outros cuidados a cultura requer?
A pitaya é uma cultura rústica, porém responsiva à irrigação, adubação e sombreamento. Para que o produtor consiga frutos de qualidade é necessária a adoção de tecnologias que favoreçam o desenvolvimento dos frutos, para que possam expressar o máximo seu sabor. A adoção destas práticas, juntamente com a polinização manual, permitirá a obtenção de produção e produtividade que facilitarão a permanência do produtor no mercado.
TodaFruta – Como a pitaya pode ser propagada?
A pitaya pode ser propagada tanto por via sexuada, utilizando-se sementes, quanto por via vegetativa. De maneira geral, a propagação por sementes só é utilizada em programas de melhoramento genético, uma vez que, quando a planta é propagada desta forma, temos, além de grande período improdutivo, variabilidade genética, ou seja, a planta pode se assemelhar ao pai, à mãe, ou a nenhum deles, e isto não é desejável em pomares comerciais, onde se busca precocidade de produção e uniformidade. Desta forma, para instalação de pomares, recomenda-se que a propagação seja feita por via vegetativa, sendo a propagação por estaquia dos cladódios a mais utilizada.
TodaFruta – Por que não é recomendável plantar uma única planta?
Não se recomenda o plantio de apenas uma planta devido à auto-incompatibilidade polínica que pode ocorrer em alguns genótipos. Essa auto-incompatibilidade faz com que a frutificação não ocorra ou possa estar severamente reduzida. Desta forma, recomenda-se o plantio de ao menos dois genótipos, para que uma planta seja polinizadora da outra.
TodaFruta – O seu trabalho mostra que polinizadores diferentes podem produzir resultados diferentes, portanto quais os clones que deveriam ser utilizados?
A polinização da pitaya apresenta um fenômeno conhecido como metaxenia, que é o efeito do grão de pólen sobre os tecidos do ovário, ou seja, nas características dos frutos. Esses efeitos podem ser refletidos no tempo requerido para o desenvolvimento do fruto, coloração, formato, tamanho e sabor. Em trabalhos realizados na UNESP/Jaboticabal, foi observada que a polinização de plantas de pitaya vermelha de polpa branca (Hylocereus undatus) com pólen de pitaya de polpa roxa (H. polyrhizus) resultou em frutos com maior massa e menor acidez do que os frutos polinizados com pólen de pitaya do cerrado (H. setaceus).
TodaFruta – Comente sobre a propagação da pitaya por estaquia.
A propagação por estaquia é a forma mais fácil e barata de se propagar a pitaya. Consiste no enraizamento de ramos inteiros ou segmentos de ramos, podendo ser utilizado materiais resultantes da poda da planta. O tamanho do ramo a ser utilizado depende da quantidade de material disponível e, mesmo pequenos segmentos enraízam facilmente, não havendo necessidade de serem tratados com reguladores de crescimento nem efetuar cura prévia das estacas. A estaquia pode ser realizada em leitos de enraizamento contendo areia ou em saquinhos plásticos com terra ou substrato. Depois de enraizadas, as estacas dos leitos de enraizamento devem ser transplantadas para os saquinhos plásticos, onde são mantidas até que as brotações alcancem 0,5 m de comprimento, quando já podem ser levadas para plantio definitivo a campo.
TodaFruta – Comente sobre a propagação por enxertia.
A enxertia é uma prática muito utilizada na fruticultura que permite que haja união de características favoráveis entre as duas partes a serem unidas, como vigor e tolerância a fatores bióticos e abióticos. Nas cactáceas, é realizada principalmente em espécies ornamentais, utilizando-se a pitaya como porta enxerto para espécies mutantes que não são capazes de efetuar a fotossíntese. Apesar de não usual, a enxertia em pitaya pode ser uma estratégia no manejo da pitaya amarela (H. megalanthus), espécie suscetível a nematoides do gênero Meloidogyne. Trabalhos conduzidos na Colômbia indicam que a pitaya vermelha é tolerante ao nematoide Meloidogyne incognita, desta forma poderia ser utilizada como porta-enxerto para a pitaya amarela. A enxertia da pitaya pode ser feita em porta-enxertos previamente enraizados ou não. Neste segundo caso, o enraizamento do porta-enxerto e a união da enxertia ocorrem ao mesmo tempo, o que é vantajoso, em relação à enxertia convencional, devido à economia de tempo na produção da muda, uma vez que não é necessário um tempo maior em viveiro para a obtenção dos porta-enxertos. Em experimentos realizados pela UNESP/Jaboticabal, foi verificado que tanto a utilização do método de enxertia por inglês simples quanto por fenda cheia resultaram em sucesso no pegamento. O mais importante é que a área enxertada seja totalmente protegida. A união do enxerto com o porta-enxerto pode ser feita por fita biodegradável, fita parafilme e fita veda-rosca, sendo esta última uma opção interessante, pois além da facilidade de ser encontrada no mercado, tem baixo custo.
Foto 2 – Plantas de pitaya amarela, conduzidas no mesmo local. A que apresenta ramos amarelados (seta) foi propagada por estaca, enquanto a outra é enxertada. À direita, detalhe da região da enxertia.
Foto 3 – Enxertia de pitaya do tipo fenda cheia, utilizando-se arame e parafilme para proteção da região da enxertia
Foto 4 – Enxertia de pitaya do tipo inglês simples, protegendo-se a região da enxertia com fita veda-rosca
TodaFruta – Comente sobre sistemas de condução da pitaya.
Por ser uma planta de hábito escandente, incapaz de se suportar por si só, a pitaya necessita de tutoramento para seu cultivo. No Brasil são utilizados principalmente tutores artificiais, sendo os mais comuns mourões de madeira e postes de concreto. Também podem ser utilizados tutores vivos (árvores), utilizando-se vegetação pré-existente (algum plantio perene abandonado) ou plantando-se os tutores, porém essa prática não é comum no país. Na escolha de um tutor, deve-se levar em conta a vida útil da pitaya e do tutor, o custo e a manutenção, atentando-se que ele deve ser forte o suficiente para aguentar a massa verde produzida pela pitaya. No caso da escolha de tutores vivos, deve-se dar atenção às podas de condução e de abertura da copa, para que o sombreamento não seja excessivo. A vantagem do uso de tutores vivos é que não há necessidade do uso de tela de sombreamento, além de ser possível seu aproveitamento em sistemas agroflorestais (SAF).
Foto 5 – A pitaya produz, ao longo do tempo, grande quantidade de ramos que, somada também aos frutos produzidos, resulta em grande quantidade de massa verde. Caso o tutor não suporte a planta, pode haver queda e quebra da planta, como pode ser observada na foto, resultando em prejuízo, em plena época de produção.
Quando se utilizam tutores artificiais, estes devem ter entre 1,5 e 2,0 m acima do nível do solo e possuir, na extremidade superior, um suporte para os ramos da pitaya. Esse suporte pode ter formas e ser feito de diversos materiais, como madeira, arame, bambu e até pneus velhos. É importante que, no caso da utilização de arame, estes sejam cobertos com canos, para que não danifiquem os ramos da pitaya. De modo geral, se cultivam de duas a quatro plantas por tutor.
Foto 6 – Cultivo comercial de pitaya na cidade de Taiaçu, SP, utilizando-se como tutor mourão de eucalipto e como suporte madeira e arame coberto por tubulação plástica.