(Caldas – 26/8/2021) A uva Syrah, casta de uva tinta da família Vitis vinifera, está cada vez mais em alta no mercado de vinhos finos de Minas Gerais. O motivo? A uva se adequou muito bem à dupla poda, técnica adaptada pela Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (EPAMIG) que inverte o ciclo natural das videiras, feito que permite colheitas e produção de vinhos de inverno.
Neste ano, a colheita da uva Syrah em vinhedos do Sul de Minas começou no início do mês de agosto. No vinhedo institucional da EPAMIG, localizado no município de São Sebastião do Paraíso (MG), a safra de 2021 se destacou por ser a mais produtiva desde o plantio das videiras, em 2011. De acordo com o pesquisador da empresa, Francisco Câmara, a colheita bateu a marca de 3700 quilos de uva Syrah, com destaque para os excelentes índices de maturação tecnológica e fenólica.
“A maturação tecnológica é caracterizada por sólidos solúveis, os açúcares, em torno de 24° brix, acidez total de 101 meq/L e pH de 3,08. Boa maturação fenólica corresponde a taninos pouco adstringentes e sementes com coloração marrom escura, o que indica evolução da própria maturação”, explica Francisco.
O pesquisador conta que, em 2021, a safra de uvas Syrah da EPAMIG também se destaca em comparação aos últimos dois anos sem colheitas. O vinhedo da empresa foi afetado por condições climáticas responsáveis por aumentar o ataque de míldio na florada, o que levou a perda total da produção.
“O ponto crucial da safra de 2021 foi a adaptação da época de poda para a região de São Sebastião do Paraíso. As videiras foram podadas no dia 17 de fevereiro. Isso transferiu a florada para épocas de menos índices pluviométricos e diminuiu a pressão de patógenos na florada, principalmente o míldio, com um intervalo de 168 dias entre a poda e a colheita”, enfatiza Francisco.
Para o empresário José Procópio, proprietário da vinícola Stella Valentino, a Syrah já pode ser considerada uma uva ícone do Sul de Minas. Ele conta que as uvas colhidas em sua propriedade em 2021 estão com muita qualidade. As expectativas são de bons vinhos para os próximos anos.
“Nós dividimos o vinhedo e colhemos metade para fazer vinhos Gran Reserva e outra metade para fazer vinhos jovens. As uvas estão espetaculares. A perspectiva é de vinhos muito bons. Colher uvas no inverno por meio da dupla poda é sinônimo de ótimas safras. Inclusive, algumas são super ótimas”, analisa José Procópio.
Um vinho Gran Reserva possui a categoria de qualidade superior. Segundo a legislação brasileira, para ser enquadrado nessa categoria, o vinho precisa estagiar por, pelo menos, doze meses em barricas de carvalho antes de ser engarrafado e comercializado.
Ainda de acordo com Francisco Câmara, uma vez que as uvas Syrah colhidas neste ano são de qualidade elevada, espera-se que, durante a fase de vinificação, a EPAMIG também elabore vinhos Gran Reserva, uma linha de produtos inéditos da empresa de pesquisa agropecuária mineira.
“Após a colheita deste ano, a estimativa de produção da EPAMIG é de três mil garrafas. Desse número, esperamos que mil garrafas sejam provenientes do Gran Reserva. O restante será proveniente da linha tradicional que a EPAMIG já elabora”, conclui.
Fonte: EPAMIG, empresa vinculada à Secretaria de Agricultura, Pecuária e Abastecimento de Minas Gerais (Seapa).
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O setor de enxertia de uva de mesa ainda é bem incipiente no país. De acordo com o pesquisador da Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (EPAMIG), Francisco Câmara, não existe no Brasil uma lei que obrigue o produtor a plantar mudas de videira por meio de enxertia. É possível fazer os plantios até mesmo por meio de sementes. Contudo, o pesquisador destaca que ao plantar sem utilizar porta-enxertos, o produtor fica mais suscetível a pragas de raízes, tanto nas variedades americanas e, sobretudo, nas variedades europeias.
O enxerto é a parte que forma a copa da planta, isto é, aquilo que nós vemos, como as folhas e os ramos que são produzidos. Já o porta-enxerto forma o sistema radicular das plantas, ou seja, o que nós não vemos por estar “escondido” no solo.
“O uso de porta-enxertos oferece diversas vantagens para o produtor. Não usá-los não vale a pena. Os porta-enxertos protegem as plantas de pragas e doenças, fazem com que elas se formem muito mais rápido e favorecem a produção entre dois e três anos, isso em comparação com as mudas de sementes. É por esses e outros motivos que utilizamos porta-enxertos na viticultura”, enfatiza.
Entre as técnicas de enxertia mais utilizadas, destaca-se a enxertia de “garfagem”, realizada diretamente no campo em porta-enxertos de estacas lisas (sem raízes) ou enraizadas, ambas previamente plantados nos locais definitivos de plantio. Todavia, outra técnica de enxertia de destaque é a “enxertia de mesa”. Esse processo é realizado em locais fechados e permite a produção de mudas de videira em larga escala.
Francisco enfatiza que a técnica de enxertia de mesa oferece diversas vantagens ao produtor em relação ao método tradicional de enxertia de campo, como altas taxas de pegamento, uniformidade, redução do tempo de obtenção das mudas, redução da mão-de-obra e controle de viroses. Porém, devido a necessidade de estruturas especiais, a disponibilidade de viveiristas que produzem esse tipo de muda no mercado ainda é pequena.
Segundo o ex-pesquisador da EPAMIG e proprietário da Vitácea Brasil, Murillo de Albuquerque Regina, o processo de enxertia de mesa pode ser dividido em três etapas. A primeira delas compreende a coleta, conservação e o preparo do material. A segunda consiste na enxertia, no acondicionamento e na forçagem dos enxertos. Por fim, a terceira etapa contempla a aclimatação e o transplante das mudas.
Os porta-enxertos e os enxertos empregados na enxertia de mesa são retirados dos ramos de plantas-matrizes sadias durante o período de repouso vegetativo. As estacas são imersas em soluções fúngicas e, em seguida, embaladas e acondicionadas em sacos plásticos antes de encaminhamento às câmaras frias.
A conservação do material vegetativo em câmara fria deve ocorrer no período de, no mínimo, 30 dias, em temperaturas próximas de 3 a 5°C e umidade relativa em torno de 85-90%. Isso permite o escalonamento das operações e exerce papel fundamental nas atividades fisiológicas das gemas, de acordo com Murillo. Para se fazer a enxertia, os materiais são retirados das câmaras frias com um ou dois dias de antecedência.
As dimensões dos porta-enxertos devem apresentar 30 centímetros de comprimento e diâmetro entre 7 e 12 milímetros. Em seguida, todas as gemas do porta-enxerto são eliminadas para evitar a brotação de ramos “ladrões” durante o período de forçagem. Os enxertos são podados com uma gema deixando aproximadamente dois centímetros de ramo em sua porção superior e cinco centímetros na parte inferior. Depois dessa adequação, os materiais são acondicionados em caixas plásticas com água para reidratação até a próxima etapa: o momento da enxertia.
No método de enxertia de mesa efetua-se o corte tipo “ômega”. Segundo ele, esse método permite rendimentos maiores e confere uma união perfeita entre o enxerto e o porta-enxerto. Após a enxertia, a região enxertada deve ser coberta com parafina, material que a protege de dessecamento e de penetração de fungos patogênicos. Depois dessa operação, as estacas enxertadas são acondicionadas em caixas plásticas e levadas para locais com condições ambientais apropriadas para união do enxerto e do porta-enxerto, processo chamado de forçagem. “As mudas são colocadas em ambiente controlado; com temperatura entre 25 e 29°C, umidade relativa entre 85-90% e boa aeração; e inicia-se, na região da enxertia, uma intensa multiplicação celular, o que forma o calo. O tempo de permanência nesse local é variável. Porém, para temperaturas próximas dos 27°C, são necessários entre 20 e 30 dias”, afirma Francisco, com base na literatura especializada da área.
Após o processo de forçagem dos enxertos, as mudas passam por uma etapa de aclimatação durante, aproximadamente, uma semana. O objetivo é reduzir possíveis estresses provocados pelo excesso de luminosidade e de variações de temperatura e umidade.
As caixas de mudas, então, são transferidas para galpões abertos, onde a exposição à luz deve ser feita de forma gradual. Somente após o período de aclimatação as mudas são transplantadas para viveiros a céu aberto, locais onde permanecem por praticamente um ano para formação do sistema radicular e desenvolvimento das mudas.
Findado esse período, as mudas são coletadas e levadas para limpeza e padronização do tamanho das raízes. Cada muda permanece com uma brotação de uma gema, novamente parafinada na região da enxertia. Ao fim de todo esse processo, as mudas são destinadas ao produtor em caixas de papelão com lotes de 300 mudas cada uma.
O Campo da EPAMIG no município de Caldas (MG) é a única adega enológica experimental na região Sudeste do Brasil. São cerca de 500 hectares de vinhedos registrados com a técnica da dupla poda, além das áreas com produção tradicional voltadas para as uvas para espumantes.
Fonte: Epamig