(Matéria originalmente publicada no site da Casa do Produtor Rural – ESALQ/USP em 10/04/2017)
A obtenção de sementes orgânicas no Brasil é um dos principais entraves do setor. Atualmente, a produção é restrita, em grande parte, aos agricultores familiares. A Lei nº 10.711, referente ao sistema nacional de sementes e mudas, garante respaldo a essa atividade, mas não permite a comercialização de sementes no mercado.
Compras, vendas e trocas só podem ser realizadas entre os produtores, segundo Sylvia Wachsner, coordenadora do Centro de Inteligência em Orgânicos (CI Orgânicos) da Sociedade Nacional de Agricultura (SNA). “O setor de orgânicos no Brasil ainda está em formação, e os requisitos para a industrialização e comercialização de sementes é complicado e oneroso, conforme atestam as empresas que produzem sementes do gênero”, comenta.
PESQUISA E DESENVOLVIMENTO
Um dos desafios dessa produção, de acordo com ela, é a utilização de germoplasmas (recursos genéticos) adaptados às regiões brasileiras. “Devem ser geradas tecnologias ecológicas e adotados métodos orgânicos de manejo dos cultivos. Além disso, é preciso criar métodos de controle de microrganismos associados às sementes”, explica a especialista.
Sylvia salienta ainda que “o melhoramento é uma das iniciativas para incrementar a pesquisa e o desenvolvimento de cultivares de hortaliças adaptadas ao manejo orgânico”.
Como as sementes não podem receber tratamento ou produto químico ou sintético no cultivo, nem no armazenamento, torna-se necessário elaborar tecnologias e pesquisas relacionadas com o uso de produtos alternativos. “Durante todo o processo, a qualidade sanitária das sementes é muito importante. O local para a produção das sementes deve ser bem escolhido para que se evite problemas como a contaminação cruzada e a criação de barreiras naturais”, relata a coordenadora.
Similar às convencionais, as sementes orgânicas também dependem da aprovação do Registro Nacional de Sementes e Mudas (Renasem) e as empresas que produzem precisam ter unidades de beneficiamento.
USO DE CONVENCIONAIS
Existem alimentos anunciados como orgânicos, mas foram produzidos a partir de sementes convencionais? De acordo com Sylvia, a legislação orgânica brasileira só permite o uso de sementes convencionais, não transgênicas e não tratadas, no caso de não haver produção orgânica. Mas o período para a conversão de sistemas precisa ser respeitado. “O processo de certificação orgânica, nesse caso, exige que os produtores comprovem a não disponibilidade no mercado de sementes orgânicas e também a utilização de sementes convencionais, não tratadas”, diz a especialista.
Em 2014, o governo brasileiro constatou que não havia oferta suficiente de sementes orgânicas para atender à demanda nacional e determinou, dois anos depois, que as Comissões Estaduais de Produção Orgânica publicassem uma relação de sementes orgânicas disponíveis. No momento, essas listas estão em fase de elaboração.
FRUTAS E HORTALIÇAS
A coordenadora do CI Orgânicos destaca que a produção brasileira da maioria de frutas e hortaliças orgânicas utiliza sementes convencionais, não transgênicas e não tratadas. “As autoridades acreditavam que essa contradição poderia acabar no passado, mas essa prática teve de ser prorrogada para adaptar-se à realidade nacional.”
Atualmente, médios produtores de hortaliças orgânicas, que cultivam diversas variedades, recorrem ao mercado convencional, assim como os pequenos agricultores. “O governo teve de permitir o uso de sementes convencionais, até que possam existir no mercado sementes orgânicas para suprir esse vazio. Caso contrário, o crescimento da produção orgânica seria reduzido”, observa Sylvia.