Com objetivo de enxugar a máquina pública, reduzir despesas e melhorar a eficiência das entregas à sociedade, o governador Ratinho Júnior propôs a fusão do IAPAR com o EMATER, CPRA e CODAPAR, instituições vinculadas à Secretaria da Agricultura e do Abastecimento do Estado – SEAB. Contudo, cabe ressaltar que, quando se trata de ciência, esse discurso encontra um contraponto ao posicionamento do atual Ministro de Ciência e Tecnologia, o Dr. Marcos Pontes, que diz: “Orçamento para ciência, tecnologia e inovação é investimento”; e ainda garante que: “O investimento em tecnologia tem retorno significativo”.
Compartilhando dessa opinião, nós pesquisadores do IAPAR tecemos as seguintes considerações:
O Instituto Agronômico do Paraná – IAPAR é uma instituição pública estadual de ciência, tecnologia e inovação (ICTI) em agropecuária, que tem a missão de “Prover soluções inovadoras para o meio rural e o agronegócio do Paraná”. Com um papel social, econômico e ambiental singular e de extrema importância, a pesquisa pública realizada no IAPAR atende as demandas da sociedade, de forma estratégica a garantir competitividade e sustentabilidade das atividades agropecuárias.
Enquanto organizações do setor privado realizam pesquisas para o desenvolvimento de tecnologias com fins comerciais, as quais muitas vezes são utilizadas pelos agricultores sem uma avaliação muito criteriosa de suas corretas aplicações, benefícios e impactos sobre a produtividade e o ambiente, o IAPAR gera conhecimento e desenvolve tecnologias que possibilitam o aumento da produtividade com redução dos custos de produção, diminuição dos riscos ambientais, tais como a ocorrência de erosão do solo e contaminação das águas, riscos biológicos, como a ocorrência de pragas e doenças, além de promover a conservação dos recursos naturais, aumento da segurança alimentar, redução da penosidade do trabalho no campo, entre outros.
Criado há 46 anos, o IAPAR é um dos protagonistas no desenvolvimento da agropecuária paranaense. Ao longo desse tempo se consolidou como uma marca forte e de alta credibilidade na geração do conhecimento e de tecnologias em diversas áreas da agropecuária, conferindo-lhe reconhecimento nacional e internacional no meio científico. Apesar de sua relevância, as ações de apoio ao IAPAR têm sido negligenciadas pelos governos ao longo das duas últimas décadas. O abandono por parte dos governos veio acompanhado de cortes no orçamento, de falta de reposição de pessoal e de uma avalanche de procedimentos administrativos cada vez mais burocratizantes, que levaram a instituição a uma crise que hoje beira o colapso.
Essa crise demonstra a necessidade urgente de uma reestruturação institucional, de modernização de suas ações, de investimentos financeiros, de contratação de pessoas qualificadas e de uma gestão com foco em resultados. E fundir o IAPAR com outras três instituições com finalidades e necessidades distintas de reestruturação, parece estar longe de ser a melhor opção para reverter a crise e alavancar o desenvolvimento científico e tecnológico na agropecuária do Paraná, setor este com tem grande peso no desenvolvimento econômico do Estado.
Historicamente, fusões de instituições com naturezas distintas foram executadas em resposta adaptativa a um quadro orçamentário restritivo. Especialmente na década de 90, alguns estados brasileiros fizeram a fusão de suas instituições de pesquisa agropecuária com outras entidades, principalmente com as de extensão rural. E os resultados dessas fusões, em geral, foram prejudiciais às ações de pesquisa, que passaram a ficar em segundo plano na nova organização formada, perdendo prioridade.
Um estudo realizado pelo Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE), organização ligada ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, mostra que não há equidade orçamentária e de apoio político entre pesquisa e extensão na maioria das instituições em que ocorreram as fusões. Nestes casos, a pesquisa tende a perder forças, pois seus resultados demoram mais para serem atingidos e retornarem de forma aplicada pela sociedade, fazendo
com que a visibilidade da pesquisa seja menor. O estudo ressalta que, se a administração da organização não estiver atenta, há o risco de perda de identidade como organização de pesquisa agropecuária. Observa-se também que, em geral, não há melhoria das relações entre as atividades de pesquisa e extensão nas instituições onde houve a fusão, o que significa que existe apenas uma mera junção de ações, as quais, na prática, não se relacionam.
A fusão proposta pelo governo implica na extinção do IAPAR como instituição autônoma de pesquisa, e poderá trazer prejuízos a médio e longo prazo para a geração de conhecimento científico e tecnológico, com reflexos negativos sobre a agricultura paranaense, uma das mais produtivas e tecnificadas do Brasil. Com a extinção também há o risco de encerramento do Curso de Mestrado em Agricultura Conservacionista, que anualmente forma profissionais aptos a atuarem no ensino, pesquisa e extensão, com formação focada na realidade da agricultura paranaense.
Cabe destacar ainda que como ICTI autônoma, o IAPAR tem demonstrado grande capacidade de captação de recursos, que nos últimos quatro anos totalizou cerca de R$ 25 milhões, oriundos de fundações de apoio e órgãos de fomento, como FINEP, Fundação Araucária, CNPq e CAPES. Esses recursos foram investidos em projetos de pesquisa para a aquisição de equipamentos, insumos, infraestrutura e contratação de bolsistas, repercutindo no avanço do conhecimento científico e no desenvolvimento tecnológico para os diferentes sistemas produtivos do estado. Além disso, o IAPAR como instituição de pesquisa articula parcerias e estabelece redes de pesquisa com ICTIs e outras instituições públicas e privadas, contribuindo de forma efetiva para o desenvolvimento sustentável do Paraná.
Diante do exposto, acreditamos que a extinção do IAPAR como instituição de pesquisa autônoma acarretará prejuízos irreversíveis para o desenvolvimento de processos e produtos estratégicos, principalmente para os que se encontram fora dos interesses imediatos da iniciativa privada, com graves consequências sociais e econômicas para a sociedade paranaense.
Entendemos que há uma urgente necessidade de ações governamentais para a reestruturação, otimização do aproveitamento dos recursos financeiros e humanos colocados a serviço da agropecuária estadual, e melhora na eficiência nas entregas. Entretanto, nos parece que a realização de um estudo aprofundado sobre as possibilidades de ajustes e arranjos institucionais, com análise de riscos e consequências, além de proposições concretas que
garantam a real reestruturação das organizações, são ações importante que antecedem a opção pela fusão, e poderão balizar de forma segura o novo governo em sua tomada de decisão, evitando que problemas de difíceis soluções posteriores possam via a acontecer em função de decisões pouco embasadas.
Pesquisadores do IAPAR
Londrina, janeiro de 2019